As razões de juiz para prender Queiroz: esconderijo, influência, milícia e prova

A decisão do juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau ao mandar prender o policial militar reformado Fabrício Queiroz indica o que a Justiça sabe sobre o esquema conhecido como "rachadinha" e quais temores basearam a decisão de deter Queiroz.  O policial, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) quanto este era deputado estadual no Rio de Janeiro, foi preso na manhã desta quinta-feira (18) em um imóvel de Atibaia (SP) que pertence a Frederick Wassef, advogado do parlamentar.
Em 46 páginas de decisão, o juiz lista evidências coletadas até agora no curso da investigação e cita preocupação de que Queiroz poderia afetar de diversas formas o inquérito, caso permanecesse em liberdade. Itabaiana cita desde o próprio endereço em que ele se localizava, que não era o informado à Justiça e que ele parecia se esforçar em esconder, até a suspeita da relação de Queiroz com milícias que atuam no Rio de Janeiro. O juiz ainda argumenta que o policial e a sua esposa, Márcia Aguiar, foragida da Justiça, parecem deter autoridade sobre outros investigados, que orientam a se ausentar a depoimentos e até a alterar provas. A defesa do policial reformado considera que as alegações do magistrado são "ilações" e apresentará um habeas corpus pela sua libertação nesta sexta-feira (19). Endereço Como ficou evidenciado na operação desta quinta-feira, Fabrício Queiroz estava localizado em Atibaia, no interior de São Paulo, em um imóvel registrado como escritório do advogado Frederick Wassef. Apesar disso, a sua defesa anterior informou à Justiça que ele se hospedava em um hotel no bairro do Morumbi, na cidade de São Paulo. Procurado pelos investigadores, o hotel respondeu que "não houve hospedagem da pessoa citada" no endereço informado. O paradeiro de Queiroz só foi localizado por meio de uma mensagem em que a esposa dele, Márcia Aguiar, relata que o policial reformado estava "escondido em uma casa". O juiz Flávio Itabaiana ainda anota que o ex-assessor e a esposa desligavam os telefones celulares antes de entrar na cidade de Atibaia, o que indica que eles gostariam de evitar serem descobertos por um rastreamento. "Parte da rotina de ocultação de paradeiro de Fabrício Queiroz envolvia restrições em sua movimentação e em suas comunicações, sendo monitorado por uma terceira pessoa", escreve o magistrado. Portanto, ao estar se escondendo, o juiz argumenta que é possível concluir que ele planejava poder fugir caso a sua prisão fosse decretada. Influência política e milícia Em outubro de 2019, o jornal O Globo divulgou um áudio atribuído a Fabrício Queiroz em que o ex-assessor falava sobre a possibilidade de indicação para "mais de 500 cargos" na Câmara e no Senado, em gabinetes de políticos que teria ajudado a eleger. Nas conversas interceptadas, Nathália Queiroz, filha do policial reformado, envia o link da reportagem para a mãe com a legenda "como meu pai é burro". Márcia Aguiar compartilha com o marido, que confirma ser ele o autor do áudio divulgado pela reportagem do jornal. Para o magistrado Flávio Itabaiana, isso indica que Fabrício Queiroz, se permanecesse solto, poderia utilizar essa suposta influência política a seu favor a fim de dificultar a investigação. Há um capítulo mais delicado, que trata da suposta relação do policial reformado com milícias que atuam no Rio de Janeiro. Além da relação com o miliciano Adriano da Nóbrega, morto em uma operação policial na Bahia, há conversas entre Queiroz e a mulher em que os dois tratam de pedidos para que o ex-assessor intercedesse em meio a conflitos dentro do grupo miliciano.  A mulher de Fabrício Queiroz chega a se referir ao marido como "bandido que tá preso dando ordens aqui fora, resolvendo tudo". "Demonstra que ele poderia ameaçar testemunhas e outros investigados e obstaculizar a apuração dos fatos, perturbando, assim, o desenvolvimento da investigação e de futura ação penal", escreve o juiz. Outros investigados e provas O juiz Flávio Itabaiana cita que a investigação conduzida pelo Ministério Público identificou em Fabrício Queiroz o papel de operador financeiro do esquema suspeito. A investigação original trata da suspeita de que servidores listados no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) repassavam parte de suas contribuições mensais ao ex-assessor. Há a suspeita de que ao menos parte do dinheiro tenha sido utilizada em favor do filho do presidente da República e hoje senador. Nesse papel de operador, Queiroz teria sido o responsável por arregimentar parte das pessoas suspeitas de participar do esquema, sob as quais exerceria papel de orientador e autoridade. Assim, poderia interferir nos depoimentos de testemunhas e dificultar a produção de provas no processo. Dois episódios narrados tiram essa suspeita do campo das ideias. Evidências coletadas na investigação indicam que ele orientou Raimunda Veras Magalhães, suspeita de ser ex-assessora fantasma do gabinete de Flávio Bolsonaro, a se esconder para evitar depor às autoridades. Também é listada a informação de que Luiza Paes, outra ex-servidora investigada, foi orientada por Queiroz a falsear em 2019 um livro de ponto da Alerj para evitar que sua ausência recorrente ao gabinete fosse descoberta. O magistrado ainda coloca que Fabrício Queiroz e a mulher aparentam ter financiamento externo, de uma terceira pessoa, uma vez que os custos das despesas do casal não seriam condizentes com os vencimentos que o ex-assessor recebe como policial reformado.  "Por fim, não se pode deixar de destacar que a prisão dos investigados Fabrício José Carlos de Queiroz e Márcia Oliveira de Aguiar há de ser decretada para asseguramento da aplicação da lei penal, haja vista que foi exaustivamente demonstrado pelo Ministério Público que ambos estão se escondendo, recebendo auxílio de terceiro, que possivelmente detém autoridade sobre os referidos investigados, não se podendo perder de vista que ambos cogitam fugir caso tenham ciência de que foi decretada sua prisão preventiva", conclui. Outro lado A defesa de Fabrício Queiroz elabora um pedido de habeas corpus que será apresentado à Justiça do Rio. O texto deve ser finalizado na manhã desta sexta-feira (19) e apresentado no mesmo dia. Terá como principal argumento o estado de saúde de Queiroz, que cuida de um câncer, mas também vai versar sobre aspectos que questionam a necessidade de mantê-lo preso sob o argumento da suposta ameaça às investigações. Segundo o novo advogado dele, Paulo Emílio Catta Preta, os argumentos para a prisão preventiva de Queiroz são genéricos, "ilações". Há a expectativa de conseguir, no mínimo, uma prisão domiciliar.

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