Cartéis, gangues e facções criminosas se adaptam ao mundo em pandemia

Assim como deixou marcas na economia legal, o coronavírus afetou a criminalidade. Mas como cartéis, máfias e gangues não atuam de maneira monolítica, o impacto varia de acordo com o crime. Autoridades do mundo todo relatam redução de atividades ligadas a narcotráfico e contrabando, mas alertam para o aumento de delitos que já eram feitos em home office, como fraudes de cartão de crédito, golpes online e pedofilia.

A matéria continua após a publicidade

 
“O crime organizado vai encontrar um jeito de se adaptar a essa nova realidade, porque essa é a natureza da atividade”, disse ao Estado o professor Leandro Piquet Carneiro, coordenador do programa de pesquisa em segurança e criminalidade da Universidade de São Paulo (USP). “Mas vai sofrer (o impacto) como todo mundo.”
Com mais de 1 milhão de infectados e metade da humanidade em quarentena, o narcotráfico foi um dos primeiros negócios afetados. No início da pandemia, a medida mais comum adotada por todos os governos, além da quarentena, foi a suspensão de viagens e o fechamento de fronteiras.
“Agora, os carregamentos estão mais fáceis de serem monitorados. Não há carros nas ruas, aviões não decolam e navios não zarpam. Qualquer movimento suspeito é detectado facilmente”, afirmou Frédéric Massé, um dos diretores da Red Coral, que monitora o crime na América Latina.
Outro problema é que a China é crucial na cadeia de suprimentos de muitas organizações criminosas, especialmente na América Latina. Eles fornecem de tudo, desde bugigangas e produtos falsificados até precursores químicos para a fabricação de drogas. Com a pandemia, o governo chinês fechou fábricas, o que cortou as remessas e criou um gargalo na cadeia produtiva.
A gangue Unión Tepito, que controla a venda de produtos falsificados na Cidade do México, não consegue mais viajar à China para acertar a compra de mercadorias em razão das restrições de viagens. Em fevereiro, a MVS Noticias, rádio da região metropolitana da capital mexicana, relatou que camelôs e comerciantes já não estão pagando mais extorsões ao grupo.
Já o problema do cartel Jalisco Nueva Generación é a falta de precursores químicos para fabricar o fentanil, opioide que faz sucesso nos EUA. Há relatos de funcionários do Ministério da Justiça do México de que a produção foi paralisada desde que a China cortou as exportações.
O isolamento social tem sido um desastre também para gangues especializadas em assaltos, furtos e roubos. Nos EUA, na semana entre 15 e 21 de março, houve queda de 42% dos crimes em São Francisco, 24% em Nova York, 22% em Detroit, 19% em Los Angeles e 13% em Chicago.
John MacDonald, criminologista da Universidade da Pensilvânia, diz que a razão é simples: as pessoas estão em casa. “Não há vítimas andando nas ruas”, disse MacDonald ao Marshall Project, grupo de jornalismo investigativo. Em muitos lugares, ruas vazias significam prejuízos para ladrões de carro.
Na semana passada, a Iniciativa Global da ONU contra o Crime Organizado Transnacional (GI-TOC) publicou o relatório Crime e Contágio, em que relata o caso da Bósnia, onde o roubo de veículos é um problema crônico. “Os bandidos estão reclamando que é mais difícil roubar carros quando as ruas estão vazias”, diz o texto. Pela mesma razão, a rede de informantes da GI-TOC registrou uma redução em homicídios e roubos na Sérvia e em Montenegro.

Siga o canal do Destak News e receba as principais notícias no seu Whatsapp!