Esquema de fraude na Prefeitura de Santos 'abastecia' ambulância quebrada

Um servidor municipal e dois funcionários de um posto de combustíveis são acusados de integrar esquema criminoso que lesou os cofres públicos de Santos em R$ 184 mil no abastecimento de veículos oficiais, conforme levantamento preliminar da prefeitura.
 

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Sem trafegar há cerca de um ano, uma ambulância da Prefeitura de Santos vinha sendo diariamente “abastecida”, embora não fosse colocada no veículo uma gota sequer de diesel.
A fraude foi detectada pela Seção de Transportes (Setrans) da Secretaria de Saúde, porque o abastecimento da frota é realizado mediante o uso de cartões magnéticos vinculados aos veículos.
A identificação do servidor público municipal também foi possível porque é necessário informar o número de registro funcional, além da quilometragem do veículo, por ocasião de cada abastecimento.
A utilização de um micro-ônibus da Secretaria de Saúde na fraude também é apurada, conforme informa o delegado Luiz Ricardo de Lara Dias Júnior, titular da Delegacia de Investigações Gerais (DIG).
“Ao contrário da ambulância, o micro-ônibus não está inoperante. Porém, ele registra abastecimentos incompatíveis com a sua quilometragem”, explica Lara.
O delegado apura a eventual participação de mais servidores e de outras pessoas no crime. Ele não descarta o uso de mais veículos da frota da prefeitura no cometimento da fraude dos abastecimentos fantasmas.
Flagrante
Ambulâncias eram supostamente abastecidas em um posto localizado na esquina das ruas Silva Jardim e Luís Gama, no Macuco (Foto: Alexsander Ferraz/AT)
Após tomarem ciência do esquema em relação à ambulância e de que ela era supostamente abastecida no posto localizado na esquina das ruas Silva Jardim e Luís Gama, no Macuco, policiais da DIG se dirigiram até lá no fim da tarde de quinta-feira (7).
Segundo o investigador Paulo Carvalhal, o frentista Dermival de Jesus, de 45 anos, demonstrou “nervosismo”, porque os agentes acharam o cartão de abastecimento vinculado à ambulância sobre o balcão de pagamento do posto.
De acordo com Alysson Paulo da Silva Manuel, chefe da Setrans, o cartão começou a ser usado de forma contínua no último dia 7 de outubro para supostamente abastecer o veículo que não circula desde 2018.
Dermival admitiu aos policiais que o cartão lhe foi entregue pelo funcionário público Rodrigo Scura Amorim, de 39 anos. “Todos os dias, o cartão da viatura que estava quebrada era passado nos terminais do posto”, conta Carvalhal.
Como não eram realizados os abastecimentos, os valores correspondentes às transações fantasmas eram pegos de pagamentos feitos em espécie por clientes do posto. Dermival disse que ficava com pequena parte dessas quantias, repassando o restante ao servidor.
“Um cliente qualquer vai ao posto e realiza o pagamento em dinheiro. O frentista pega a quantia e passa o cartão da prefeitura, registrando o valor correspondente ao que foi embolsado. Assim, funciona a fraude”, resume o delegado.
Dermival foi autuado em flagrante por peculato, cuja pena varia de dois a 12 anos de reclusão, sendo recolhido à cadeia. Pelo mesmo delito, Lara indiciou Rodrigo Scura Amorim e o também frentista Rodrigo Paixão da Silva, de 39 anos, que não foram localizados.
Os investigadores da DIG apuraram que Paixão também ficava com o cartão corporativo durante o seu turno de trabalho no posto, registrando abastecimentos fictícios na ambulância.
Previsto no Artigo 312 do Código Penal, o peculato consiste em “apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”.
Embora os frentistas não sejam servidores municipais, eles também respondem por peculato. Circunstâncias e condições de caráter pessoal, como o status de funcionário público, quando “elementares do crime”, se comunicam entre os envolvidos, conforme o Artigo 30 do Código Penal.
Pagou fiança e foi solto
Advogado Marcelo Cruz representa um dos suspeitos do caso de esquema de fraude (Foto: Alexsander Ferraz/AT)
O juiz Leonardo de Mello Gonçalves concedeu liberdade provisória a Dermival de Jesus no fim da manhã de sexta-feira (8), durante audiência de custódia. Em contrapartida, o frentista pagou fiança de R$ 5 mil e deverá comparecer bimestralmente em juízo para justificar as suas atividades.
Os advogados Marcelo Cruz e Felipe Gaspar defendem Dermival e requereram a soltura do cliente, sob o argumento de ausência dos requisitos da prisão preventiva.
A promotora Roberta Aline Saragiotto se manifestou favorável à concessão da liberdade provisória, porém, mediante a imposição das medidas cautelas de comparecimento periódico em juízo e de pagamento de fiança.
Na audiência de custódia, o magistrado não realiza análise de mérito. Inicialmente, ele verifica se o auto de prisão em flagrante preencheu as formalidades legais.
Em caso positivo, como ocorreu no episódio dos abastecimentos fantasmas, o juiz converte a prisão em flagrante em preventiva ou a substitui por medidas cautelares, concedendo liberdade provisória para o autuado responder ao delito solto.
Cruz também defende o outro frentista e o servidor público apontado como o mentor do esquema. Sem antecipar a sua tese, ele disse que pretende apresentá-los na DIG na próxima semana para prestar os esclarecimentos necessários.
O inquérito policial foi distribuído à 5ª Vara Criminal de Santos. O Ministério Público (MP) ainda oferecerá denúncia contra os três indiciados, mas não está vinculado à interpretação jurídica do delegado. Ele pode manter, abrandar ou agravar a acusação.

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