Gilmar Mendes a Janot: 'Recomendo que procure ajuda psiquiátrica'

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reagiu nesta sexta-feira, 27, à declaração dada pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot em entrevista ao Estado e disse lamentar que uma parte do “devido processo legal no País” tenha ficado “refém de quem confessa ter impulsos homicidas”.

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Em nota crítica à atuação do ex-procurador, Gilmar também recomenda que Janot procure ajuda psiquiátrica e diz que o combate à corrupção no Brasil se tornou refém de fanáticos. Mais tarde, em entrevista após evento em Brasília, o ministro disse não imaginar que houvesse um "potencial facínora" no comando da PGR.
O antecessor de Raquel Dodge, que deixou a chefia da PGR recentemente, disse ao Estado nessa quinta-feira, 26, que no momento mais tenso de sua passagem pelo cargo, chegou a ir armado para uma sessão do STF com a intenção de matar Gilmar a tiros. “Não ia ser ameaça não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar) e depois me suicidar”, afirmou Janot.
“Dadas as palavras de um ex-procurador-geral da República, nada mais me resta além de lamentar o fato de que, por um bom tempo, uma parte do devido processo legal no País ficou refém de quem confessa ter impulsos homicidas, destacando que a eventual intenção suicida, no caso, buscava apenas o livramento da pena que adviria do gesto tresloucado. Até o ato contra si mesmo seria motivado por oportunismo e covardia”, diz Gilmar na nota (leia na íntegra no fim da matéria).
Na nota, o ministro do STF, crítico aos métodos da Operação Lava Jato, afirma que o combate à corrupção no Brasil, “justo, necessário e urgente”, “tornou-se refém de fanáticos que nunca esconderam que também tinham um projeto de poder”. “Dentro do que é cabível a um ministro do STF, procurei evidenciar tais desvios. E continuarei a fazê-lo em defesa da Constituição e do devido processo legal”, continua.
O ministro ainda afirma estar surpreso, e que sempre acreditou estar exposto “no máximo” a “petições mal redigidas, em que a pobreza da língua concorria com a indigência da fundamentação técnica”. “Agora ele revela que eu corria também risco de morrer”, afirma.
“Se a divergência com um ministro do Supremo o expôs a tais tentações tresloucadas, imagino como conduziu ações penais de pessoas que ministros do Supremo não eram. Afinal, certamente não tem medo de assassinar reputações quem confessa a intenção de assassinar um membro da Corte Constitucional do País. Recomendo que procure ajuda psiquiátrica. Continuaremos a defender a Constituição e o devido processo legal”, concluiu Gilmar.
Gilmar também foi às redes para contra-atacar. “É difícil não imaginar os abusos cometidos ao acusar e processar investigados", escreveu no Twitter. Lamento que o ex-chefe da PGR tenha sido capaz de cogitações homicidas por divergências na interpretação da Constituição".

Críticas ao modelo de escolha do PGR

Em entrevista em Brasília nesta sexta,  Gilmar Mendes insistiu que a atuação de Janot enquanto esteve à frente da PGR precisa ser analisada pelo País. O ministro criticou o modelo de indicação do cargo de procurador-geral, que chamou de “corporativo”, e disse que o sistema político terá de descobrir novos critérios para a escolha. “Modelo deu errado”, afirmou.
Gilmar disse que imagina que hoje “todos aqueles que foram responsáveis” pela indicação de Janot devem estar “pensando na sua alta responsabilidade em indicar alguém tão desprovido de condições para as funções”. 
O ministro também afirmou que, por se tratar, em sua “impressão”, de um “problema grave de caráter psiquiátrico”, a atuação do ex-procurador atinge todas as medidas que ele solicitou e foram deferidas na Suprema Corte. “Denúncias, investigações, e tudo o mais. É isso que tem que ser analisado pelo País”, emendou.
“Eu entendo que, na verdade, elas foram feitas por um tipo de pessoa com essa qualidade psicológica, com essa personalidade e por isso elas precisam ser analisadas a partir dessa perspectiva”, respondeu Gilmar, que disse não cogitar tomar alguma medida judicial contra o ex-procurador.
Desde 2003, a escolha do PGR pelo presidente da República tem seguido, mesmo que não obrigatoriamente, a chamada lista tríplice, que é votada pela Associação Nacional dos Procuradores da República. Neste ano, ao escolher Augusto Aras para comandar o Ministério Público, o presidente Jair Bolsonaro quebrou essa trajetória, já que Aras nem chegou a concorrer dentro da associação.
Gilmar criticou o que chamou de “sistema corporativo” de escolha de membros do Ministério Público para a função, e lembrou que, até a Constituição de 1988, a chefia da PGR era ocupada por um notável jurista, normalmente de fora da carreira do MPF. “Depois de 88 é que se tornou essa coisa corporativa e introduziram-se essas escolhas inclusive de figuras como o procurador Janot, com essas qualidades que os senhores viram”, afirmou Gilmar.
'Crise de abstinência'
Questionado sobre a motivação de Janot para revelar agora o caso, o ministro afirmou que, a ele, parece que o ex-procurador está passando por uma crise de abstinência após um período de “apogeu” que viveu durante sua atuação na PGR. “Não disponho de elementos para avaliar. A mim me parece, de qualquer forma, que ele viveu, e aí graças também à mídia, um momento de apogeu e agora está vivendo na verdade um momento, está passando por uma crise de abstinência, muito provavelmente. Um problema psicológico muito sério e certamente isso explica um pouco desses desatinos”, disse. 
Perguntado ainda se a segurança do tribunal precisa passar por algum tipo de mudança, Gilmar disse que a presidência do STF “certamente discutirá” o assunto. “Vamos avaliar isso”, afirmou.
Leia a nota de resposta de Gilmar Mendes a Janot na íntegra:
"Dadas as palavras de um ex-procurador-geral da República, nada mais me resta além de lamentar o fato de que, por um bom tempo, uma parte do devido processo legal no país ficou refém de quem confessa ter impulsos homicidas, destacando que a eventual intenção suicida, no caso, buscava apenas o livramento da pena que adviria do gesto tresloucado. Até o ato contra si mesmo seria motivado por oportunismo e covardia.
O combate à corrupção no Brasil - justo, necessário e urgente - tornou-se refém de fanáticos que nunca esconderam que também tinham um projeto de poder. Dentro do que é cabível a um ministro do STF, procurei evidenciar tais desvios. E continuarei a fazê-lo em defesa da Constituição e do devido processo legal.
Confesso que estou algo surpreso. Sempre acreditei que, na relação profissional com tão notória figura, estava exposto, no máximo, a petições mal redigidas, em que a pobreza da língua concorria com a indigência da fundamentação técnica. Agora ele revela que eu corria também risco de morrer.
Se a divergência com um ministro do Supremo o expôs a tais tentações tresloucadas, imagino como conduziu ações penais de pessoas que ministros do Supremo não eram. Afinal, certamente não tem medo de assassinar reputações quem confessa a intenção de assassinar um membro da Corte Constitucional do País.
Recomendo que procure ajuda psiquiátrica.
Continuaremos a defender a Constituição e o devido processo legal."

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